Washington (25.ago.2025) – Agentes e procuradores federais afirmam que a prioridade dada pelo governo Donald Trump ao combate à imigração irregular tem desviado pessoal e recursos de investigações sobre exploração sexual infantil na internet.
Servidores atuais e antigos relataram ao The Verge que unidades especializadas, como o Homeland Security Investigations (HSI) – braço do Departamento de Segurança Interna (DHS) responsável por apurar crimes digitais contra menores – vêm recebendo novas funções ligadas à fronteira ou aumento de carga de processos. “Para uma única mudança de prioridade, esta é a maior que já vi”, disse um ex-agente do HSI sob anonimato.
Reorganização interna
O HSI, que conseguiu em 2024 separar sua marca pública da sigla ICE para evitar associação direta com deportações, agora vê parte de seu efetivo realocado. Reportagens de Reuters e USA Today já indicavam que milhares de policiais federais foram direcionados a casos migratórios; fontes ouvidas repetem a avaliação.
Questionada sobre quantos agentes foram deslocados, a porta-voz do DHS, Tricia McLaughlin, não respondeu. Ela ressaltou que “quase todos os dias o ICE prende pedófilos, sequestradores e traficantes de crianças” e citou a recente condenação do hondurenho Olvin Rodriguez-Inestroza por distribuição de material de abuso infantil.
Aumento de denúncias
Enquanto isso, o volume de alertas ao National Center for Missing & Exploited Children (NCMEC) dispara. O serviço CyberTipline recebeu 16,9 milhões de registros em 2019; em 2023, foram 36,2 milhões. Em 2024, houve queda para 20,5 milhões, atribuída, em parte, ao avanço da criptografia de ponta a ponta em plataformas como as da Meta.
Falta de estratégia e cortes em treinamento
Um relatório do Government Accountability Office (GAO) de dezembro de 2022 apontou que o Departamento de Justiça (DOJ) não cumpria todos os requisitos da lei PROTECT Our Children, de 2008. O DOJ divulgou uma estratégia nacional em junho de 2023 e prepara atualização, segundo a porta-voz Natalie Baldassarre.
Ainda assim, o principal curso anual de capacitação do DOJ, o National Law Enforcement Training on Child Exploitation, foi cancelado em 2025 sem explicação pública. Baldassarre disse apenas que o Departamento “pode manter dois focos críticos ao mesmo tempo: processar criminosos que exploram crianças e garantir o uso eficiente dos recursos públicos”.
Imagem: Cath Virginia via theverge.com
Processos parados e prescrição
Procuradores ouvidos descrevem investigações travadas: laudos demorados, mandados aguardando análise e prazos legais prestes a expirar – alguns crimes de material de abuso infantil prescrevem em cinco anos. “Não é por serem casos complexos; falta gente disposta a tocá-los”, relatou um funcionário do DOJ.
Números de processos e evasão de servidores
Entre outubro de 2024 e julho de 2025, foram abertas 2.676 ações federais por exploração infantil, ante 2.494 no mesmo período anterior, informou o DOJ. Paralelamente, cerca de 4.000 empregados aceitaram planos de saída antecipada, segundo a CBS News.
Apelos no Congresso
O senador Ron Wyden (D-OR) apresentou o Invest in Child Safety Act, que prevê US$ 5 bilhões para reforçar as equipes. Em carta ao Inspetor-Geral do DHS, Wyden pediu investigação sobre a transferência de recursos. “Os trumpistas estão dando passagem a estupradores e predadores infantis para inflar os números de imigração”, declarou.
Para Brock Nicholson, agente aposentado do HSI, a equação é simples: “Quando você retira recursos de uma área já pouco priorizada, ela fica ainda mais negligenciada. Essas crianças deveriam ser nossa maior prioridade”.
Com informações de The Verge